5 de out. de 2009

Financiamento público

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O Presidente da República cogitou que a reforma política será prioridade em seu próximo governo, caso ele logre êxito nesta eleição.

Já há um projeto de reforma política em fogo brando no parlamento. O fogo sobe ou desce conforme a conveniência dos donos do fogão.

Um dos pontos polêmicos da reforma é o financiamento público de campanha, que caso já fosse a regra nas eleições de 2006, a União despenderia cerca de R$ 800 milhões para custear o preenchimento das cadeiras das Assembleias Legislativas, Câmara, Senado Federal e Presidente da República.

As campanhas políticas custam bem mais do que a maioria dos candidatos declaram e a Justiça Eleitoral finge acreditar. A diferença da conta é a medida exata da hipocrisia que acalenta o sistema de financiamento atual.

No atual sistema, o candidato sai em busca de financiamento privado. A sua capacidade de arrecadação é proporcional ao seu potencial de sucesso, ou às articulações de poder econômico-financeiro que possui.

Neste contexto, as campanhas são uma corrida desigual. É como soltar no oceano uns com botes e outros a nado, e ver quem chega primeiro no continente.

As empresas não doam dinheiro para candidatos: elas emprestam para receber de volta com as devidas atualizações, através de obras ou serviços que o candidato deve arrumar, com as devidas fraudes e direcionamentos nos processos licitatórios. O sistema de financiamento atual, portanto, conduz à corrupção.

O financiamento privado de campanha é um investimento de risco e por isto tem um preço de retorno inflacionado: quem investe dez quer de volta cem, pois, pode perder tudo.

Na dúvida, há aqueles que atiram para todos os lados. Não é incomum ver empresas aparecendo como doadores de recursos para candidatos de opostos vieses, e como grande parte das empresas tem caixa dois, a maior parte das doações dali saem para o caixa dois dos candidatos.

O candidato, no desespero da campanha, aceita a agiotagem. Por isto, Charles de Gaulle disse que uma das virtudes do estadista é a ingratidão, pois se ele cumprir tudo o que prometeu na liça, quebra o Estado e perde a cabeça.

Resulta do atual modelo a presença cada vez maior do poder econômico, a ponto de o Estado estar aparelhado por grupos de poder econômico que financiam a “democracia”.

Há um outro agravante no sistema de financiamento privado, mormente no Brasil, cujo sistema de combate ao crime organizado é incipiente: o crime organizado financia campanhas políticas. Há muito dinheiro ilícito nas campanhas, e isto, sobremaneira, reforça a atividade criminosa.

O financiamento público seria uma forma de tornar o processo eleitoral menos injusto e mais transparente: saber-se-ia exatamente quanto o partido estaria dispondo e só daquilo ele poderia dispor, e Justiça Eleitoral poderia, de forma mais efetiva, punir aquele que porventura estivesse gastando além do recebido.

A disputa seria menos desigual. Menos provável seria o uso da máquina administrativa por parte daqueles que as têm.

O argumento defendido pelos que são contra o financiamento público, é que o Brasil não pode financiar campanhas quando falta saúde, educação e saneamento: este é o argumento dos inocentes, o que é cálido, ou dos hipócritas, o que é cínico.

Tudo o que se gasta nas campanhas já é público: ou sai dos caixas dois que os governos conseguem fazer, através de conluios com as empresas, ou é fruto da agiotagem eleitoral que é o empréstimo, camuflado de doação, para pagar quando ganhar.

A nação é a única provedora do Estado. É necessário que o cidadão saiba o preço de tudo aquilo que paga. Quanto mais souber o custo da democracia, mais valor dará a ela.

O financiamento público tornaria legal o que já é fato, tiraria do mau político o argumento da extorsão da coisa pública como forma de auto financiamento, e baixaria o custo das campanhas, que a cada eleição são cada vez mais caras.

Mas o financiamento público só pode ser adotado se com ele vier o sistema de listas fechadas, onde, ao invés de se votar em candidatos, o eleitor votaria em um partido. Este silogismo se fecharia com o fortalecimento do sistema democrático, que se consolidaria com a força das estruturas partidárias.

Há também, os defensores do sistema misto, no qual haveria um valor básico fornecido pelo Estado, e os candidatos, ou partidos, poderiam buscar financiamento privado para complementar a campanha, o que, ao meu ver, é chover no chão molhado do sistema atual.

O financiamento misto, todavia, é o sistema mais usado nos países da América Latina. Somente o Brasil, Venezuela, Bolívia, Chile, El Salvador, Honduras, Nicarágua e Uruguai,  possuem financiamento privado. O Peru somente o público. Os demais países adotam o sistema misto.

Os EUA, uma democracia consolidada e relativamente eficaz, usa o sistema misto, com uma particularidade: o candidato escolhe se quer ser financiado pelo Estado ou quer angariar fundos privados. Uma vez escolhido um tipo de financiamento, ele não poderá receber de outro durante aquela eleição.

O Brasil já descobriu que precisa mudar certos comportamentos para cumprir o seu futuro de país desenvolvido. A reforma política é um elemento primordial para queimar esta etapa.

É uma pena que o eleitor venha a perder nesta eleição, que talvez seja tomada pela discussão de quem é  o menos corrupto e o mais providente, a oportunidade de discutir a reforma política com o seu candidato, cobrando dele posições sobre o tema.

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