15 de jun. de 2009

Como uma onda

Pintando ondas - Jezebel. Clique na imagem para seguir o link. Os destinos de uma cidade não dependem exclusivamente da habilidade administrativa do seu gestor principal.

Todavia é correta a pressuposição de que as atitudes tomadas pelo administrador são catalisadoras dos rumos que tomarão as ondas de desenvolvimento, a inércia ou a regressão da urbe.

A história se faz em ondas: o gerenciamento deste ciclo pode mudar o rumo da onda, intensificá-la ou diminuí-la.

As ondas se formam com as atitudes que tomam os cidadãos – quando votam, por exemplo - e uma vez quebradas, a história engrena o ciclo, arrastando consigo quem a ela quer resistir.

Cada ciclo deixa as suas próprias marcas, que vão dando o perfil das cidades.

O ciclo gerencial que conhecemos, as ferramentas administrativas que a legislação nos entrega, e a forma como as manejamos, já rompeu. Restou-nos a espuma nas mãos, e a ingênua impressão de que a onda voltará.

O desafio das cidades modernas, e dos administradores conseqüentes, é descobrir novas formas de gestão e empregar coragem para induzi-las.

As cidades se perdem nos escaninhos do conservadorismo da classe política e repelem qualquer tipo de reforma que desconstituam interesses quase tribais.

As cidades são organismos vivos, têm vontade própria e são temperamentais. Agir contra a vocação delas é meio caminho para uma administração pífia, no máximo razoável.

Em que última vez se debateu a vocação de Belém? O que deve ser feito para que a cidade se revitalize? Qual o projeto que Belém precisa para sair deste ciclo descendente na qualidade dos serviços que presta?

Não basta trocar o prefeito: isto seria a negação do primeiro parágrafo deste texto e uma obviedade lúdica.

A verdadeira mudança e o rebojo de uma nova onda estão menos no eleito e bem mais no eleitor.

Quem faz Belém somos nós. Os gestores, que saem dos nossos desejos, podem também sair dos nossos erros e são, ao final, o repositório das nossas felizes, ou infelizes, vicissitudes.

8 de jun. de 2009

O petróleo latino americano

petrolnacio[1] O Financial Times, editado na Inglaterra e um dos mais prestigiados diários de economia do mundo, publicou matéria em que o Brasil representa o futuro do petróleo latino-americano.

Aponta a reportagem, o promissor horizonte brasileiro, “em contraste com os problemas enfrentados pelos dois maiores e mais tradicionais produtores da região, Venezuela e México ".

Prossegue a matéria, afirmando, com um ufanismo que, se não fosse o Financial Times, eu poderia desconfiar que a matéria é paga, que "nos últimos dois anos, a Petrobras, a sofisticada empresa brasileira estatal de capital aberto, descobriu reservas tão promissoras em águas profundas na costa sudeste que os executivos estão comparando esta nova fronteira com o Mar do Norte, que salvou o mundo da crise energética criada pelo Oriente Médio nos anos 1970".

Ainda com aquela desconfiança pueril, que teima em se afastar, por se tratar de tão escorreita publicação, leio na reportagem, a opinião de que “o Brasil tem gerido bem sua indústria, permitindo que a Petrobras se transforme em uma das mais avançadas companhias internacionais de petróleo".

A seguir o Financial Times retorna à linha, advertindo que a Petrobras tem grandes desafios técnicos, políticos e financeiros para explorar as novas reservas de petróleo e sugere que os políticos apressem a nova legislação para regular o desenvolvimento dessas novas reservas.

Aconselha ao Brasil estar atento aos erros da Venezuela e do México, que, com políticas equivocadas, acabaram por fragilizar as suas respectivas industrias petrolíferas nacionais

O jornal é duro com o ditador da Venezuela Hugo Chaves (o ditator é termo meu), ao afirmar que, em seus dez anos no poder, Hugo Chávez "dizimou a PDVSA, a estatal venezuelana do petróleo, que nos anos 1990 aparecia como uma das mais bem gerenciadas do mundo".

Fundamenta a sua afirmação ao constatar que a produção venezuelana caiu de 3,4 milhões de barris em 1999, antes de Chávez chegar ao poder, a 2 milhões atualmente.

Da mesma forma, o Financial Times, reprova a política petrolífera mexicana, ao afirmar que "por mais de 50 anos, o México rivalizou com a Venezuela como o mais importante produtor de petróleo da América Latina. Mas o país também usou demais sua empresa estatal de petróleo como cofrinho para tirar dinheiro".

Já que temos uma indústria diversificada, deve haver cautela para que as descobertas do pré-sal não venham super dimensionar a inserção da indústria petrolífera nacional, a ponto de prejudicar a própria dinâmica cambial, como aconteceu em países como a Noruega, que corrigiu a tempo esta singularidade econômica lá ocorrida.

Não podemos chegar a desinteligência de ter tanto petróleo e ficar sem saber o que fazer com ele, ou usá-lo a desserviço dos outros setores da indústria nacional.

6 de jun. de 2009

Fatalidades em série

domino

Pelo que leio da tragédia do vôo 447 da Air France, começo a concluir que a aeronave já tinha certo estoque de potenciais avarias, que em condições normais se ocultavam, mas, sob a pressão da turbulência, se revelaram.

A manutenção preventiva da Air France precisa ser verificada, como aliás já se está fazendo ao providenciar a troca imediata do equipamento que faz a leitura da velocidade no A330: entrar em uma severa turbulência com velocidade incorreta pode ser uma fatalidade irreversível.

As 24 mensagens automáticas enviadas pelo A330, em um intervalo de 4 minutos antes do colapso, indicam que a aeronave sofreu uma septicemia generalizada: o computador que a comandava, ao constatar que não mais poderia providenciar estabilidade ao vôo, entregou nas mãos do piloto um avião moribundo.

Revelou-se uma missão impossível ao comandante, emprestar sua perícia ao manche e comandar a aeronave a porto seguro: ela já estava sem possibilidade de sustentação.

A ausência do pedido de socorro, o famoso “mayday”, não suplicado nos quatro minutos de agonia das 228 almas embarcadas, talvez revele o esforço de concentração que o comandante inculcou para tentar evitar que todos tivessem que pagar o óbolo à Caronte.

O A330, sem poder responder aos esforços do comandante, devido ao colapso de seus sistemas, e a possível quebra do leme, começou a romper suas estruturas: seria a desintegração, ainda no ar, que alguns peritos supõem.

Sempre raciocinei com certa desconfiança sobre o sistema que se tornou o estado de arte da transmissão de comandos em grandes aeronaves, o fly by wire: uma maravilha mecatrônica, sem um sistema mecânico puro auxiliar.

Os engenheiros sempre contestaram desconfianças deste tipo, alegando que o fly by wire, onde as transmissões de comandos de navegação são todos feitos por impulsos eletrônicos, são seguros à medida que há dois sistemas de energia alternativa, para o caso de uma falha no principal.

Alegam ainda os projetistas, que a probabilidade de colapso dos três sistemas é remotíssima, autorizando a dispensa de um quarto sistema, puramente mecânico, onde os cabos transmitiriam os comandos ao seu destino, aplicando navegabilidade ao engenho: seria, como na época da navegação aérea romântica, a mão do piloto a conduzir o vôo.

Em aviação não há acostamento. A Lei de Murphy sempre deve ser considerada ao seu absurdo: "se alguma coisa pode dar errado, com certeza dará".

Portanto, a título de cortar custos e aperfeiçoar lucros, não foi prudente retirar os cabos da cadeia de comando das aeronaves: que lá permanecessem, à espreita de garantir o último arrego.

Não é correto afirmar que se cabos houvesse no A330, pudesse o comandante ter manejado, com a força do seu braço, a sua aeronave.

Mas, é absolutamente factual afirmar que foi desesperador para ele, receber do computador um avião que, por pane elétrica generalizada, não podia mais receber comando algum, pois lhe fora retirada a possibilidade mecânica, ainda no projeto.

1 de jun. de 2009

Aprendizes de feiticeiros

laser[1] Quando a bomba atômica foi anunciada, o mundo inteiro admirou-se com a constatação do poder destrutivo do engenho advindo do estudo do átomo.

Nos dias de hoje, o arsenal atômico se reduziu a ogivas carregadas em supersônicos, cargas de metralhadoras giratórias.

A coisa se vulgarizou a tal ponto que o mundo despercebe anúncios com poderes destrutivos infinitamente maiores.

Os cientistas do laboratório Lawrence Livermore, nos arredores de São Francisco, na Califórnia, apresentaram, no último sábado, o que eles afirmam ser o laser mais potente do mundo.

O NIF, sigla em inglês para National Ignition Facility, é capaz de reproduzir o calor e a pressão de uma estrela e é principalmente destinado – seja lá o que isto signifique - a “a avaliar a confiabilidade e a estabilidade do arsenal nuclear americano”.

Afirmam ainda os cientistas, que o NIF pode ser a chave para o domínio da fusão de hidrogênio.

Trocando em miúdos: o NIF pode convergir 192 raios laser de a alta pressão para um mesmo ponto, reproduzindo a temperatura e a pressão do núcleo de uma estrela ou de um planeta gigante.

O diretor do programa, Edward Moses, discursou empolgado que "o sucesso do NIF será uma descoberta científica histórica; a primeira combustão por fusão dentro de um laboratório, reproduzindo na Terra o processo que aciona as estrelas".

Já devidamente apresentados ao NIF, vou dizer a vocês a minha conclusão sobre o aparato:

Em se considerando que o engenho foi financiado pela Administração Nacional de Segurança Nuclear, NNSA, na sigla em inglês.

Em se considerando que o diretor da NNSA, Tom d'Agostino, disse, na apresentação do NIF, que “o laser contribuirá com os esforços destinados a manter ativa a força de dissuasão nuclear dos Estados Unidos, sem fazer testes.”

Em se considerando que os cientistas dizem ainda que o NIF “viabilizará avanços importantes nas áreas de astronomia e astrofísica, ao recriar as condições existentes nas supernovas, os buracos negros e até no núcleo dos planetas gigantes”.

Não tenho dúvidas de que o NIF é a mais destruidora arma nuclear já construída pelo ser humano desde a bomba atômica, passando pela bomba de nêutrons.

Não tenho dúvidas, ainda, que os EUA usarão o NIF como uma arma de dissuasão nuclear, e aí está a tradução da afirmação dos cientistas e do NNSA sobre o objeto do programa.

Isto, é evidente, não descarta as demais utilidades que a equação pode ter, como na área de energia limpa, por exemplo, à medida que o NIF pode elaborar o processo de fusão nuclear.

Sob o ponto de vista utilitário o NIF é um fascinante progresso cientifico, mas, dada a sua objetividade militar, é uma insensatez.

Porém, comme il faut , a guerra sempre será o mais insensato capricho dos homens.