28 de jul. de 2008

Os cavaleiros das trevas

O Coringa: seria Batman o seu alter ego? Chris Nolan resolveu fazer uma terapia coletiva com o seu novo Batman – O cavaleiro das trevas.

A terapia se faz nas doses de reflexão que o filme traz sobre o caos urbano e, junto com ele, o adventismo da hipocrisia cotidiana, carregada de fantasias de moralidade.

De novo rouba a cena nos filmes do homem morcego, o seu mais espetacular inimigo: o Coringa, desta vez interpretado pelo falecido Heath Ledger, que se tornou conhecido pela sua atuação no ganhador do Oscar “O Segredo de Brokeback Mountain”.

Ledger superou o não menos magistral Jack Nicholson, que interpretou o último Coringa e ofuscou quem deveria coadjuvar.

“Esta cidade merece criminosos melhores”, arrota um reflexivo Coringa, em uma das falas mais sugestivas do filme, ilustrando a dualidade de valores que passa a sociedade tecnologicamente admirável e sociologicamente falida.

O avanço do crime acaba fazendo com que o Cavaleiro das Trevas tome a justiça nas próprias mãos para finá-lo, ignorando o devido processo legal.

Seus métodos estão tão somente no seu cinto de utilidades: para eliminar o Coringa, o Batman transforma-se em um justiceiro ao arrepio das instituições.

Os dois, portanto, vilão e mocinho, acabam sendo dois lados escuros da mesma moeda da delinqüência, mas, a sociedade, frustrada com os métodos sem resolução das instituições, aplaude as atitudes fora da lei do justiceiro, porque elas são mais eficientes para livrá-la do sorriso escachado e sórdido do Coringa.

Está então constituída Gotham City, a metrópole que é palco da saga: tão obscura quanto o seu super-herói e tão caótica quando o vilão que merece ter.

O Brasil está a viver o complexo de Gotham City no que tange a sua nova fase de limpeza política.

A tal lista suja, é um exemplo de como se quer fazer justiça ao eleitor, por um método totalmente inconstitucional, mas absolutamente liminar.

Fica mais caótica a solução, quando a atitude vem de quem deveria zelar pela aplicação da lei.

Os juízes eleitorais passaram a ser os cavaleiros das trevas, a trazer a justiça ao seu próprio arbítrio, arquivando o processo legal que os atrapalha na missão de render a pátria dos supostos vilões.

Os políticos são os coringas, anomalias que a sociedade finge achar que vieram de outro planeta, tergiversando a verdade que afirma serem eles apenas uma amostragem do todo.

Não de todo parafraseando o Coringa, é bem verdade que o Brasil merece melhores políticos, mas, também procederia a tese de que eles deveriam estar acompanhados de magistrados menos inquietos em acudir seus arroubos de justiça passando por cima do processo e invertendo a mão dos princípios e garantias fundamentais do cidadão: antes fossem mais céleres no cumprimento do dever de julgar.

Não devemos nos esquecer da parábola de Martin Niemöller: "Um dia vieram e levaram meu vizinho que era judeu. Como não sou judeu, não me incomodei. No dia seguinte, vieram e levaram meu outro vizinho que era comunista. Como não sou comunista, não me incomodei. No terceiro dia vieram e levaram meu vizinho católico. Como não sou católico, não me incomodei. No quarto dia, vieram e me levaram; já não havia mais ninguém para reclamar..."

O mais grave é que além de não se incomodar com estes versos tortos que andam inventando, a sociedade ainda aplaude as rimas.

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