14 de jul. de 2008

A exceção pela regra

algem[1] O banqueiro Daniel Dantas não fez fortuna tão de repente sendo bom samaritano.

No Brasil, como em países de instituições não de todo consolidadas, não é tão difícil, para quem conhece o caminho das pedras, andar sobre o mar e multiplicar o pão.

Os milagres de Daniel Dantas, tanto quanto outros milagres que por aí se fazem, consistem em saber exatamente como transformar o público em privado aos seus respectivos proveitos.

Para não arrefecermos: partes consideráveis das grandes fortunas do mundo assim foram produzidas.

Para não presumirmos que isto não tem jeito: reflitamos que o jeito é consolidarmos cada vez mais as instituições que sustentam o Estado de Direito.

Quanto mais o Estado se protege daqueles que querem enriquecer a qualquer custo, menos os seus recursos mudam das mãos de muitos para se concentrar na renda de poucos.

Mas, não se deve contornar o Estado de Direito à título de consolidá-lo, pois aí nos defrontamos com um paradoxo absolutamente insolúvel: ou se cumprem os paradigmas legais, que salvaguardam a sobrevivência do direito, ou se é arbitrário.

Nesta tese, que para a Ciência Jurídica é um dogma, haveria razão na lavra do Presidente do STF, Gilmar Mendes, ao determinar a libertação do Senhor Dantas, se ele não o fizesse de forma tão incontinente, sem ao menos ter aguardado o prazo da prisão temporária, para ver se o juiz De Sanctis persistiria na prisão, e aí sim determinar a soltura.

Mesmo assim, carecem de solidez os libelos contra o Ministro Mendes. Eles nada mais são que sofismas que tentam ensinar a flexibilidade do Direito Positivo, de acordo com a discricionariedade do juiz: isto tem duas vias, e uma delas pode entortar o direito e atropelar a justiça, por isto o mundo civilizado tende cada vez mais à rigidez processual.

Faltou, no entanto, sensatez jurídica na segunda prisão do Senhor Dantas, albergada em decreto preventivo do juiz De Sanctis: ali ficou patente um jogo jurídico para esgrimir o Alvará do Ministro Mendes, e nem mesmo o pior criminoso pode ser objeto de rixas entre magistrados.

Isto não desqualifica o trabalho do Delegado Queiróz: embora não fosse necessária, ainda, a privação de liberdade do Senhor Dantas, há elementos suficientes para encarcerá-lo, todavia, através de sentença condenatória.

Aí é que consiste o grande problema do Poder Judiciário: ele não consegue dar respostas razoavelmente rápidas à sociedade, a não ser em laxativos intermediários como o Habeas Corpus concedido ao Senhor Dantas.

Devido a isto, a sociedade tende a defender um Estado Policial e, neste contexto, a Polícia Federal está escrevendo um texto parecido no meio dos seus inquéritos: sempre deve haver uma prisão midiática para o tal efeito didático.

A sociedade deve mudar o foco e exigir mais conseqüência ao invés de se contentar com prisões temporárias combinadas com a mídia, que sempre acabam revogadas pelo Judiciário por absoluta falta de fundamento constitucional para persistirem.

A regra irrefutável da privação de liberdade é a condenação transitada em julgado e não uma presunção de culpa ou um acessório da investigação: se a exceção virar a regra todos nós estaremos ameaçados pelo inversão.

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