23 de abr. de 2007

Que madeira é esta?

toras[1]

A Assembléia Legislativa foi palco, na quinta-feira, de uma das mais concorridas sessões especiais da sua história, para discutir a crise do setor madeireiro, que se arregimentou para fazer o mesmo discurso que se tornou recorrente nos últimos 10 anos.

Este deja vu vem se tornando mais incontornável à medida que o Pará cada vez mais se vê obrigado a cumprir a agenda da sustentabilidade.

O desespero do setor torna-se mais nervoso à medida que o discurso da geração de emprego, como núcleo semântico da justificativa da atividade, está encontrando limites na constatação de que não há sustentabilidade nela, na forma como a mesma insiste em se exercer.

Segundo cálculos do setor, mais de 20 mil postos de trabalho associados à atividade foram fechados no Pará, nos três primeiros meses de 2007. Segundo o IBGE, a indústria madeireira recuou 11,05% nos dois primeiros meses do ano.

Em 2006 o setor madeireiro contribuiu com 12,2% das exportações do Pará, com o valor de US$818,2 milhões, ficando em quarto lugar na pauta.

Estes números são suficientes para pautar atitudes do Estado que, sensível à força do setor, não cuidou de inverter o jogo e pautar a indústria rumo à sustentabilidade.

A simbiose do estado com o setor gerou a sopa de pedra que o atual governo herda e tem a missão de alquimiar em uma política florestal séria.

O recrudescimento da crise atual foi anunciado em 2003, quando a legislação pertinente sofreu alterações, mas o setor achou que resolveria os impasses com as mesmas pressões de sempre sobre os políticos de sempre, que tinham as atitudes de sempre.

Em 2006, a política do "de sempre" começou a fazer água com a edição da Lei de Concessão Florestal, que passou a gestão florestal para a competência dos estados, com responsabilidade compartilhada com o Ibama.

Nem a indústria madeireira e nem o Pará estão preparados para se submeter à legislação, por isto a transição está sendo dolorosa.

O Pará nunca se preocupou com a sustentabilidade dos setores exógenos aqui implantados, apenas fazendo questão de entrar na equação como o contabilista do PIB gerado, sem nunca ter feito a conta do passivo.

Neste diapasão, o setor madeireiro foi avançando sobre a floresta, e escondendo atrás do discurso do desenvolvimento e da geração do emprego, a degradação ambiental, o trabalho escravo, que coloca o Pará nas manchetes do mundo, a desordem do espaço urbano, o aviltamento do preço da mão de obra, a abertura de milhares de quilômetros de estradas ilegais e os danos causados nas legais, com o excesso de peso das toras sobre as carretas, para citar os mais óbvios.

As grandezas acima especificadas, se somadas e cotejadas em uma conta que nunca se ousou fazer, são maiores que a contribuição de 12% nas exportações e bem maiores que o que estas exportações agregam ao valor adicionado do Estado.

Da forma como o Pará tem deixado a serra cortar, está apenas trocando o zero por menos um e se tem alguém ganhando nesta história, não são os empregados que o setor afirma prover: para constatar isto basta dar uma olhada na diferença da casa grande para a senzala.

Isto não é um manifesto contra a atividade, mas um apelo para que se comece a fazer a coisa certa.

É possível a exploração industrial da Amazônia. É possível cortar madeira, tirar ferro e tudo quanto o engenho humana possa transformar em lucro.

Todavia, ao menos para fazer com que isto seja garantido por um tempo teoricamente indeterminado, temos que ser inteligentes o suficiente para não acabar com tudo como se fossemos morrer amanhã.

A sustentabilidade deve ser imperiosa em quaisquer atividades que doravante se pretenda exercer, pelo simples fato de que a humanidade chegou ao estágio de ter descoberto que é imortal à medida que se reproduz: não nos preocuparmos em como vão estar os recursos naturais daqui a 1000 anos é brutalidade contra os nossos descendentes.

Portanto, quem achar que sustentabilidade é coisa de ecologista que saia do ramo. Não há problema com os empregos: o Estado deve providenciar para que surja o mesmo número deles na plantação de árvores e não na derrubada utilitarista delas.

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