2 de abr. de 2007

O nó górdio

gordio[1]

Conta a mitologia que Górdio foi um camponês escolhido pelo povo, em obediência à profecia, para ser rei da Frigia.

Tornando-se rei, Górdio, para cumprir a profecia, amarrou com um nó a carroça na qual chegou ao oráculo: o famoso nó górdio.

Dizia, também, a profecia, que quem fosse capaz de desatar o nó górdio, tornar-se-ia senhor de toda a Ásia.

Muitos tentaram em vão. Alexandre Magno chegou à Frigia e também tentou desatar o nó, com o mesmo insucesso dos outros. Impacientou-se: arrancou da espada e cortou o nó ao meio.

Quando Alexandre conseguiu subjugar toda a Ásia, começou-se a pensar que ele cumprira os termos do oráculo em sua verdadeira significação.

O Império alexandrino, o maior da história, não sobreviveu a Alexandre. Com a sua morte rapidamente se esfacelou em dezenas de reinos: suas conquistas não tiveram sustentabilidade no tempo e no espaço.

As políticas de desenvolvimento da Amazônia têm sido elaboradas por alexandres que acham que cortando o nó o estão desamarrando: não têm sido dotadas de elementos sustentáveis.

Todos os projetos implantados no território paraense só têm defesa strictu sensu, e não passam de exportação de commodities. Servem preferencialmente aos interesses exógenos: o desenvolvimento regional é apenas marginal.

A inteligência amazônica, e ela há, precisa subverter esta ordem e elaborar a sua própria agenda de desenvolvimento através de instrumentos científicos nela elaborados. Basta de aceitar passivamente as soluções dos demiurgos do planalto central.

O PAC, a exemplo, contempla o Pará tão somente com projetos de infra-estrutura elaborados ainda nos tempos dos planos militaristas, que se têm revelado ineficazes, porque não conseguiram distribuir renda, resumidos a enclaves para aproveitamento financeiro de grupos econômicos que têm enriquecido a custa do empobrecimento da população.

A infra-estrutura anunciada é pertinente, até como subseqüência do que já foi iniciado, todavia, mais uma vez se está cometendo o erro de cortar o nó ao invés de desenvolver conhecimento para desamarrá-lo: só isto não trará o dito desenvolvimento sustentável.

Haveria uma mudança de paradigmas e os cenários pouco otimistas que se pintam para a Amazônia seriam modificados, caso se visse no PAC ao menos R$1 bilhão para pesquisa e investimento em biotecnologia, onde está a verdadeira sustentabilidade amazônica.

A biotecnologia, a pesquisa científica consecutiva em modelos microrregionais de desenvolvimento, resguardadas as diversas peculiaridades de cada território e um banco de informações confiáveis de cada micro sistema ambiental, aliados à infra-estrutura civil: estes são os instrumentos tecnológicos e de gestão que precisamos para desamarrar o nó do desenvolvimento sustentável que poderá alavancar a Amazônia a um cenário de riqueza e vigor, com qualidade de vida para todos.

A insistirmos nesta falta de competência para acasalarmos a exploração dos recursos naturais com a agenda ambiental, estaremos fadados a cortar um nó górdio todos os dias, repetindo os mesmos erros das gerações anteriores, até que o império amazônico nada mais seja que uma enorme savana.

Restar-nos-á o consolo de plantarmos soja na savana.

Como canta o Caetano: somos uns boçais.

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