Ao folhear a revista Veja no avião, vi um rosto conhecido e li a manchete: “Arquiteto e pedreiro. Morre Ítalo Zappa, o apóstolo da política externa independente”.
Voltei algum tempo atrás e os olhos embaçaram.
Fui a Cuba a primeira vez, nos início dos anos 80, acompanhando alguns parlamentares da Câmara Federal. No aeroporto, um homem baixo e franzino nos deu as boas-vindas apertando a mão de cada um, e correu a tomar uma valise que uma deputada portava. Pensei tratar-se, com a cortesia e simplicidade que nos dispensou, de um funcionário da embaixada brasileira.
A franzina figura pediu-nos os tickets das malas e nos alojou em uma sala onde ele mesmo nos serviu café. Meia hora depois chamou-nos para seguir ao hotel.
No trajeto ele nos falava da agenda que a embaixada nos havia providenciado. Perguntei-lhe quem era o embaixador brasileiro em Cuba. Ele tirou o cigarro constantemente à boca e desculpou-se:
- Desculpem, não me apresentei. Sou Ítalo Zappa, o embaixador.
Ficamos amigos. Voltei à Cuba e tivemos a oportunidade de jantar, na embaixada brasileira, com a presença de Fidel, amigo particular de Ítalo Zappa.
Fidel frequentava a embaixada com assiduidade à época de Zappa. Os dois costumavam fazer espaguete na cozinha, contou Fidel.
Em um dos retornos à Ilha, no final da década de 80, Zappa já fora removido para o Vietnã.
Contava Zappa, sempre com um cigarro entre os dedos, que a sua missão era abrir embaixadas, pois o Brasil se relacionava pouco com o mundo. Provava isto mostrando um mapa-múndi onde eram realçadas a Europa Ocidental e as Américas:
- Isto é o mundo para o Brasil.
Zappa expandiu as fronteiras diplomáticas do Brasil. Quando Geisel promoveu a abertura diplomática com a África era Zappa quem estava por trás. Encontrou-se lá com os líderes da luta contra o colonialismo português, Agostinho Neto, de Angola e Samora Machel, de Moçambique, para lhes garantir o apoio político do Brasil na independência que buscavam.
Os exilados brasileiros da Moçambique de então tiveram em Zappa um alento: saiu distribuindo passaportes, registrando como brasileiros os filhos dos brasileiros e oficializando os casamentos.
Após a África, pediu ao então Chanceler Saraiva Guerreiro, a embaixada de Manágua. Saraiva negou-lhe o pedido, assim como lhe negou Belgrado, devido aos problemas que a Iugoslávia enfrentava com a morte de Tito.
Zappa contou que foi ríspido com Saraiva:
- Então me mande para o meu pequeno apartamento do Baixo Leblon.
Saraiva o atendeu, mas mesmo sem posto costurou o reatamento das relações do Brasil com a China e isto lhe valeu a embaixada de Pequim, e nesse ponto o Brasil deve a Zappa um crédito que ele nunca recebeu em vida: foi ele que fez o comércio brasileiro com a China saltar de alguns milhares de dólares para a casa dos bilhões, a ponto de sermos hoje um dos principais parceiros comerciais da China.
Foi de Pequim que Zappa costurou o reatamento das relações entre o Brasil e Cuba, tornando-se o primeiro embaixador brasileiro na Ilha desde a revolução.
De Cuba costurou as relações do Brasil com o Vietnã e inaugurou a embaixada de Hanói.
Um câncer no fígado interrompeu a viagem deste Marco Polo da diplomacia brasileira, em 4 de novembro deste 1997. Deveria haver mais embaixadores como ele. Deveria haver mais brasileiros como ele.
* Texto escrito em 1997
fantastico, pelo que li, sinplicidade pura, alguem que tem o ego na altura de uma "gilete" deitada.
ResponderExcluirE pasmem em suas poucas férias passava-as aquí em ipiabas de bermuda sandália de dedos e um chapéu de palha com uma enxada na mão!! Ah pequeno grande homem
ResponderExcluirLamento vçs nào me deixarem publicar sôbre êste pequeno grande Homem
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