Cantigas de Esponsais, conto de autoria de Machado de Assis, publicado em 1884, conta a estória de Romão Pires, um maestro que chegou aos sessenta anos com o sentimento doloroso da frustração.
A razão daquilo era que Romão, apesar de ter sido um ótimo regente, não conseguia compor. Pior: trazia dentro de si belíssimas composições, tinha óperas inteiras em sua mente, chegava a ouvi-las ecoando quando se colocava a cismar, porém não conseguia escrever aqueles sons.
Romão desesperava. Não conseguia compor. Suas óperas etéreas ainda devem ecoar pelo vento, jamais, todavia, alguém poderá ouvi-las, pois o desditoso Maestro Romão Pires morreu sem conseguir compor uma nota sequer.
Sempre temos ouvido falar do imenso potencial do Pará, que tem também as suas óperas e todo um conjunto de harmonias naturais que uma vez compostas seriam ouvidas por todo o Brasil, mas, como o maestro machadiano, não tem conseguido compor.
A melodia só ecoa em nossos próprios ouvidos e em conseqüência disto chegamos talvez àquela idade em que a frustração começa a tomar conta dos nossos corações e a esperança, que é o combustível da resistência, acaba-se deixando conquistar pelo desamor.
O Pará tem cedido a sua própria fadiga estrutural. Se deixado vencer pela inércia, que acaba se fazendo mais forte que as forças que a ela se deveriam contrapor.
Este processo, seus elementos e personagens, com rara exceção, remonta por gerações: maestros que só souberam tocar as músicas já compostas, sem terem tido a aptidão de compor a própria melodia.
Isto não tange somente aos políticos, que na inteligência popular são os culpados de todos os males. Todos, políticos, empresários e intelectuais, são sujeitos deste processo.
Mas o Pará pode e deve sair disto.
É preciso criar: o potencial desaproveitado é a frustração da alma que o contém.
É preciso ousar: a ousadia tem sido a tinta com a qual a história tem escrito suas páginas.
É preciso agir: a agonia tem gerado heróis ao longo da sobrevivência humana.
Estas três notas podem gerar os três elementos necessários para se começar a escrever a nova melodia paraense: o projeto, a execução e a mudança, precisam aparecer na partitura.
Uma nota mais aguda se deve unir àquelas: a urgência, pois o mundo vive uma época bizarra na qual o que não urge perde.
Ou, podemos permanecer sentados na cadeira de balanço, olhando o horizonte, curtindo as nossas frustrações que, neste caso, tem sido a prima mais próxima da nossa incompetência.
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