Meu pai, um caboclo do baixo Tocantins, sempre que me pegava em traquinagens de menino, depois de umas raras bordoadas, aplicava-me um ralho contumaz: “rapaz, procure sempre fazer a coisa certa”.
Depois de crescido e meu pai ido, sempre que saio da linha, alguma mão pesada pousa sobre os meus ombros para tomar satisfações.
As mais recentes apurações feitas pela Polícia Federal, no desenrolar da Operação Satiagraha, demonstram que tanto o Delegado Protógenes, o investigador, quanto Daniel Dantas, o investigado, tendem a ser o mesmo lado de uma mesma moeda: usaram artifícios criminosos nos seus devidos intentos.
Nenhum merece a condescendência da República: o Senhor Dantas porque, sem dúvida, praticou cada delito apontado no relatório final do Delegado Protógenes. Este, porque lançou mão de artifícios ilegais para apurar o que no relatório lavrou, esquecendo que aquele adágio de escrever certo por linhas tortas só vale para Deus.
Para se ter uma idéia do arsenal de ilegalidades cometidas pelo Delegado Protógenes para enjaular o Senhor Dantas, está constatado que mais de 60 servidores da ABIN atuaram na operação, inclusive no episódio do monitoramento do gabinete do Presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, o que vem a ser espionagem clandestina.
Usar o aparelhamento de informação do Estado para fins de espionagem clandestina é comum em regimes de exceção e foi muito usado por Stalin e Hitler: é crime de lesa cidadania em uma República como a brasileira.
As apurações da PF desmentem o Delegado Protógenes. Ele afirmou à CPI que apura as irregularidades da Satiagraha, ter havido apenas pequena colaboração de agentes da ABIN no levantamento de dados, o que já seria uma ilegalidade, pois a ABIN não tem como missão institucional tal prerrogativa.
Outra versão do Delegado Protógenes que se esvai é a afirmação, também por ele feita à CPI, de que a Satiagraha não tinha recursos para operar e por isto tinha que pedir ajuda à ABIN: a Polícia Federal revelou que esta foi a maior e mais cara missão até hoje feita pela instituição, e custou cerca de meio milhão de reais aos cofres públicos.
O pior de tudo é que na esteira das irregularidades do Delegado Protógenes, no afã de escrever certo por linhas tortas, tornou-se imprestável o inquérito: este fatalmente deverá ser anulado, dando tempo ao Senhor Dantas de destruir provas e reorganizar circunstâncias que o beneficiarão em futuras investigações.
Perdeu, imediatamente, a República, uma ótima oportunidade de fazer justiça, por desvio de conduta de um preposto seu, no caso o Delegado Protógenes.
Fica, no episódio, a ratificação de que, pelo menos no nível de simples mortais, que só podemos escrever certo se as linhas não forem tortas.
Não pode haver, portanto, exceção para delegados, juízes, ou quem quer que seja.
Por mais nobres que possam ser os fins, eles não se justificam se os meios foram procedidos em desacordo com as regras, que, em um Estado de Direito, devem valer para todos.
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