Na semana que passou, a Folha de São Paulo noticiou um fato pouco repercutido e que, por sua gravidade, deveria merecer uma discussão mais ampla, pela imprensa e pela sociedade.
Por cerca de oito meses do ano de 2008, durante os trabalhos de investigação da Operação Castelo de Areia, a Policia Federal teve, autorizado pela Justiça, acesso irrestrito aos dados dos extratos de chamadas e cadastro de clientes de oito empresas de telefonia: Oi, Telefônica, Embratel, Vésper, Vivo, TIM, Claro, e Nextel.
Da mesma forma, tal autorização foi dada à PF, ambas pelo Juiz Fausto De Sanctis, durante a Operação Satiagraha.
Embora a autorização da Justiça não incluísse escutas telefônicas, as senhas que permitem o acesso àqueles dados não tem restrição de uso e, na prática, a PF poderia escutar a quase totalidade dos usuários de telefones do Brasil.
Afirmam alguns policiais, que este artifício é usado nas investigações para fazer escutas de pessoas sobre as quais a autoridade policial não tem elementos que convençam a Justiça a autorizar o grampo.
Com a escuta clandestina, a policia acaba colhendo algum indício que a leve a convencer a Justiça à autorização e aí então a gravação é apresentada como tendo sido feita após a autorização, legitimando-a.
No caso da Castelo de Areia, as empresas de telefonia instadas a acatar a ordem judicial, se manifestaram em juízo alegando que a determinação deveria ser mais específica, pois, da forma como fora elaborada o "amplo e irrestrito acesso a toda e qualquer informação referente às ligações efetuadas e recebidas por usuários de telefonia poderia colocar em risco a intimidade dos usuários de telefonia”.
Ainda no caso da Operação Castelo de Areia, ao se manifestar sobre o requerimento da Polícia Federal para ter acesso aos dados das empresas de telefonia, o Ministério Público, a priori, colocou-se contra a autorização, alegando a generalidade do pedido, mas, sem maiores explicações, em outra lauda concordou com o mesmo.
É preocupante que a sociedade não seja informada destas estocadas no processo legal, de onde tira o seu procedimento o Estado de Direito.
Mais preocupante ainda é a tendência atual de induzir a sociedade a pensar que isto pode ser feito, tendo como justificativa alcançar o nobre fim de colocar bandidos ricos na cadeia.
A questão, nesta falácia judiciária, é que as conseqüências destas facilidades podem ser o início de um estado policial, cujo aparato tecnológico nem a ditadura militar possuía.
O direito constitucional à privacidade, cada dia mais é uma quimera, porém, são necessários procedimentos cada vez mais rígidos que possam conter o totalitarismo do Estado à estrita fronteira daqueles sobre quem pesa algum indício de delinqüência.
Colocar a privacidade de todo e qualquer cidadão a mercê de uma instituição sob a alegação de que isto ajudará o Estado a colocar a mão em uma dúzia de delinqüentes é absolutamente temerário: com certeza há meios e inteligência suficiente para fazer a coisa certa e não simplesmente optar pelo mais fácil.
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