Na semana que passou O Liberal publicou entrevista com o Presidente do Sindicato da Indústria Madeireira do Sudoeste do Pará, Luiz Tremonte, que traduziu o sentimento da classe que ele representa: revolta e indignação com a postura da República no combate ao desmatamento da Amazônia.
Quis o entrevistado, na sua pose monocromática, dar textura verde ao retrato: afirmou que os madeireiros são os guardiões da floresta.
Também, no meio da bílis que destilava, o Sr. Tremonte emprestou de Nostradamus a prerrogativa de prever o futuro e ousou: “um dia, os madeireiros serão taxados como os heróis da Amazônia.”
Explicou o porquê da sua centúria: “Nós não fazemos corte raso, não colocamos fogo e muito menos devastamos, pois a floresta em pé é nossa sobrevivência”.
Peço vênia ao Sr. Tremonte para fazer uma observação: já que a floresta em pé é o que os mantêm vivos, deveriam então, os madeireiros, estarem já todos falecidos, pois eles já derrubaram árvores suficientes para o suicídio amplo da categoria.
Como o jogador sem boas cartas, cujo melhor artifício é o blefe, o Sr. Tremonte desfilou bravatas em forma de desafios, : “Fechem todas as madeireiras, mas fechem mesmo. Por um ano, continuem pagando os salários dos funcionários para que não haja desemprego, indenizem os proprietários e garanto, com toda segurança e sem medo de errar, que o desmatamento aumentará.”
Ele quer uma indenização. Será que no cálculo desta verba deveria estar a composição do heroísmo futuro e a paga por serem os guardiões da floresta?
Embora seja o óbvio, o Sr. Tremonte observa uma verdade: “O culpado pelo desmatamento é o próprio governo que não tem como controlá-lo e inibi-lo; só chega depois que a floresta está no chão.”
É verdade que a República, por omissão e má condução da política florestal tem o maior débito nesta contabilidade: deixou os guardiões da floresta lançarem mãos aos ferros, e, sob o fundamento insustentável de exploração de riquezas e geração de oportunidades, consentiu com a maior devastação florestal da história.
O esquisito é que quando a cavalaria chega, mesmo tarde, para remediar, ainda aparecem republicanos querendo derrubar a guarda dos alazões, ou seja, bom mesmo é que o Governo continue omisso e toque harpa enquanto a floresta arde e cai.
É isto que eu chamo de estoicismo cínico: é preciso que o Governo combata o desmatamento, desde que não mexa com as minhas serrarias.
O Sr. Tremonte resvala de vez para o pântano quando previne para as possibilidades de revoltas de desvalidos e derramamento de sangue, porque o Governo, sem mais nem menos, resolveu cumprir a lei.
Ele não esclareceu, na hipótese, de quem será o sangue prestes a jorrar, mas, nesta coluna de sangue derramado, ao que tenho visto, desde que foram rompidas as fronteiras da Amazônia pelas motosserras, mais veias foram abertas do lado do povo que os tais guardiões da floresta querem agora se valer para continuarem a fazer os seus devidos cortes não rasos.
Os madeireiros, neste grave momento em que vivem, quando se mudam paradigmas sob os quais se erigiu a classe, deveriam prescindir de manifestações da lavra do Sr. Tremonte: ele tripudia da inteligência do leitor ao achar que alguém vai comprar qualquer linha das polissindéticas orações ali cometidas.
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