Com a produção e o comércio de cocaína, Pablo Escobar amealhou uma formidável fortuna: a Forbes, na década de 80, apontou-o como o sétimo homem mais rico do mundo.
Medellín era a cidade da Colômbia, de onde Escobar comandava o conglomerado criminoso conhecido mundialmente como Cartel de Medellín.
Escobar era admirado em Medellín, onde seus negócios geravam emprego e renda na cidade.
Para manter a atividade, ele subornava as autoridades e desprezava as instituições. Quem a ele não se submetia era eliminado.
Escobar professava um dogma inescapável conhecido como plata o plomo, prata ou chumbo, no vernáculo: ou o sujeito aceitava-lhe o dinheiro, a plata, ou seria assassinado, o chumbo.
A Colômbia, frente à constatação de que o crime tomava conta do País sob a desculpa de que a cocaína gerava renda e emprego para uma população carente e sem alternativas, resolveu agir contra esta inversão de valores.
O Estado de Direito, após algumas escaramuças com Escobar, venceu.
A cidade de Medellín não desapareceu. Tem hoje cerca de 3.2 milhões de habitantes, é um dos principais centros industriais do país e é domicílio de três universidades: descobriu que havia vida fora da ilegalidade.
Estima-se que no Rio de Janeiro, o tráfico de drogas gera cerca de 200 mil “empregos” diretos. A cadeia desta atividade ilícita gera renda para mais 300 mil pessoas: 500 mil pessoas dependem do tráfico de drogas na cidade.
Ao feitio de Escobar, os chefes do tráfico corrompem agentes do governo e desprezam as instituições. Na mesma política da plata o plomo, sustentam quem lhes dá suporte e matam quem lhes nega continência.
Em São Paulo, a organização criminosa, PCC, para praticar os seus ilícitos, “emprega” cerca de 1000 pessoas na capital.
O PCC já tem filiais em todo o Brasil e agora começa a se especializar em prestar serviços de justiça paralela: instala tribunais em favelas e bairros da periferia, onde julga as contendas dos que fazem parte da sua rede.
As “demandas judiciais” vão desde briga de vizinhos a partilha de produtos de assaltos. As penas vão de chicotadas a execução: a imprensa já começa a chamar a atividade de a sharia do PCC.
Para prestar este serviço à população, o PCC está recrutando profissionais e, por conseguinte, gerando “empregos”.
A cadeia do crime de extração ilegal de madeira vai desde o conluio com índios, para alcançar-lhes as reservas, cruza pela cumplicidade de assentados pelo INCRA, passa pelos assentamentos ilegais, e chega ao assalto puro e simples à floresta.
O comércio ilegal de madeira no Pará, previsto como crime federal, guarda similitudes com as realidades retro mencionadas: não é possível, à margem da lei, arrancar do solo quantidade tão formidável de floresta, sem que uma cadeia de subornos e assassinatos se perpetre.
Conta-se, nas regiões onde este lastimável apocalipse ocorre, que agentes da lei são despesas na planilha de custos da atividade madeireira ilegal.
A atividade gera empregos e renda. Há uma diferença, todavia, em confronto com as outras mencionadas: o Estado contabiliza o produto gerado pela extração ilegal de madeira, pois, como a atividade tem uma face legal e outra ilegal, convivendo harmoniosamente, não raro, dentro da mesma empresa, não tem sido possível separar o joio do trigo: estima-se que o joio seja 70% por cento da carga deste estranho silo.
Tecnicamente, é como se o Rio de Janeiro cobrasse ICMS sobre a venda da cocaína e São Paulo ISS sobre as atividades do PCC.
À exemplo de outros locais onde qualquer atividade ilegal grassa como alternativa de emprego e renda, nas cidades onde a indústria madeireira se instala o que se vê, fora do emprego e à margem da renda, são espaços urbanos tão desorganizados, que fazem o velho oeste americano parecer com o idílico Shangri-La de James Hilton.
Junte-se o passivo ambiental cometido, a equação vigente de a atividade privatizar os lucros e socializar os prejuízos advindos da ilegalidade, não poderia ter outro resultado senão a Operação Arco de Fogo: que é menos uma solução para a tragédia e mais um tratamento de choque para a histeria que tomou conta do Pará, equivocadamente chamada de progresso.
É um equívoco sócio econômico justificar a ilegalidade sob qualquer pretexto. Fazer isto é esticar, ao limite da resistência, o eventual significado de os fins justificarem os meios, e romper a linha, transformando os pedaços em escombros de cinismo.
Não se deve usar o discurso anoético de que é preciso tolerar a ilegalidade enquanto o Estado não tem estrutura suficiente para prover a retidão: isto equivale a dizer que, ao arrepio da lei, devemos liberar a venda de cocaína enquanto não temos condições de proporcionar pleno emprego.
Tal solução, à titulo de eventualidade, é negar todo o arcabouço sociológico sobre o qual foi erigido o Estado de Direito.
Se tal fosse o caminho, estaríamos resolvendo, pela segunda via, o dilema legal que nos propôs Rui Barbosa: “ou instaure-se a moralidade, ou nos locupletamos todos.
Não há, portanto, neste caso do desmatamento ilegal no Brasil, um meio termo eventual e nem convém fazer coro com o discurso de que é preciso pensar nos empregos que perderemos: isto é a ilegalidade querendo persistir sob a desculpa da necessidade de si mesma.
Quem quiser cortar deve plantar. Quem quiser plantar deve buscar os meios legais para tal: a legalidade é mais difícil, pois é cheia de regras, mas, uma vez estabelecida, passa a ser o cimento que conduz ao verdadeiro desenvolvimento.
O Estado, por sua vez, deve parar de dar discurso a quem se quer aproveitar das suas lacunas estruturais.
Prover o empreendedor de meios legais não pode ser apenas eventual, com forças tarefas organizadas a cada choque anafilático.
Os órgãos que devem cuidar desta missão precisam ter o tamanho e a eficácia da medida do desafio que é legar progresso e desenvolvimento ao Pará, cumprindo as leis e servindo à agenda ambiental imposta pela consciência da nação.
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